quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Poeta Castrado, Não!


    Serei tudo o que disserem
    por inveja ou negação:
    cabeçudo   dromedário
    fogueira de exibição
    teorema   corolário
    poema de mão em mão
    lãzudo   publicitário
    malabarista   cabrão.
    Serei tudo o que disserem:
    Poeta castrado   não!

    Os que entendem como eu
    as linhas com que me escrevo
    reconhecem o que é meu
    em tudo quanto lhes devo:
    ternura  como já disse
    sempre que faço um poema;
    saudade que   se partisse
    me alagaria de pena;
    e também uma alegria
    uma coragem serena
    em renegar a poesia
    quando ela nos envenena.

    Os que entendem como eu
    a força que tem um verso
    reconhecem o que é seu
    quando lhes mostro o reverso:

    Da fome já não se fala
--- é tão vulgar que nos cansa ---
    mas que dizer de uma bala
    num esqueleto de criança?

    Do frio não reza a história
--- a morte é branda e letal ---
    mas que dizer da memória
    de uma bomba de napalm?

    E o resto que pode ser
    o poema dia a dia?
--- Um bisturi a crescer
    nas coxas de uma judia;
    um filho que vai nascer
    parido por asfixia?!
--- Ah não me venham dizer
    que é fonética a poesia!

    Serei tudo o que disserem
    por temor ou negação:
    Demagogo   mau profeta
    falso médico   ladrão
    prostituta   proxeneta
    espoleta   televisão.
    Serei tudo o que disserem:
    Poeta castrado   não!

               José Carlos Ary dos Santos

Desiderata